quarta-feira, 1 de abril de 2009

Abril chuvoso

Abril marca o início do tempo ameno, do ciclo das sementeiras, das sachas e regas, que culmina com as colheitas.

Borda d'Água
Diz o povo que a rês perdida em Abril cobra vida, em sinal de que
vem o tempo primaveril, em que a Natureza tudo revigora. Também
o muito badalado dito de Abril, águas mil, nos dá a medida de um tempo de chuva abundante, essencial ao desabrochar da vida campestre. Há mesmo quem diga que este mês é a chave do ano: Abril frio e molhado enche a tulha e farta o gado, ou, como variante, Abril frio traz pão e vinho.


Nos tempos idos, em que sobretudo se vivia da lavoura, chegado Abril esvaziava-se a aldeia durante o dia. O aldeão largava para o campo, onde andava de sol a sol. Ainda sob a frialdade da manhã mungia as vacas para lavrar a folha. A seu tempo a mulher viria com a cesta da merenda, altura em que, já com a ajuda da dona, se lançava na tarefa da sementeira, botando ao ventre da terra a batata e o feijão. Para mais tarde ficaria o milho, que apenas podia ir à terra quando a rola, o mais atrasado dos pássaros migrantes, arribasse e cantasse do alto dos carvalhos.

Faziam-se os regos que dividiam as belgas e serviriam o correr da água nas regas. Ao seu redor, em carreira, plantavam-se couves, alfaces e beterrabas, vindas do alfobre. Também era neste mês, se as geadas não persistissem, que o camponês plantava as leiras de pimentos, cebolas e tomates, para que no tempo tórrido houvesse fartura de saladas.

Para os miudos este também era tempo de folia. Mau grado os pais os fizessem desandar para os campos a para ajudar nas lides, havia sempre a oportunidade de uma escapadela ao bosque mais próximo, à cata de ninhos. Dizia-se quem em Abril haveria mais de mil, e o garoto percorria de olhar afiado toda a folhagem envolvente a ver se aumentava a conta de ninhos sabidos, que depois vigiaria com sete olhos, quando não lhe desse para rapinar os ovos e com eles fazer uma gemada.

O lavrador tem neste mês especial preocupação. Sabe que a água virá, o que lhe assegura o sucesso da sementeira e o bom desabrochar dos mimos, mas teme que o vento cieiro, sempre acompanhado por uma onda de frio e de secura, lhe invada os campos e impeça a lavoura de dar as suas primícias. Por isso se diz, que uma seca em Abril deixa o lavrador a pedir. E é por este ser o mês que tem a chave do ano, que nele se depositam as maiores esperanças, pois é necessário entrar bem para o resto do ciclo da vida agrária, de onde dependia a economia local.

Ainda não há muito tempo que na aldeia tudo o que se consumia era fruto da produção dos campos, regados com o suor do povo. Mau grado os tempos serem outros, isso perdura na memória dos homens da Beira, tão ligados ao seu terrunho, por conhecerem os esforços que a sua gente sempre fez por lograr salvar em cada dia a casa da fome e da miséria.

Abril, não é apenas a época das flores e do chilreio dos pássaros, em que um passeio pelo campo causa especial sedução. É sobretudo tempo em que a chuva e o sol se entrecruzam. Antigamente era nas abertas que o lavrador lançava a semente ao âmago da terra. Os assomos de sol garantiriam o desabrochar da semente, e isso era quanto bastava para contentar o camponês. Um saber clássico, passado de pais para filhos, dizia-lhe: o que Abril deixa nado, Maio deixa-o espigado». [Aqui]

Sem comentários: